A HUMANA POESIA

HUMANA POESIA

Um dia

hei de escrever a humana poesia:

vivi numa casa modesta e suburbana

onde havia goteiras,

ratos

e uma obra de igreja

- interminável.

E memórias de meus pais,

de meus irmãos,

de meus avós, de meus tios,

de meus primos

davam um tom azul

ao cinzento inumano de minha vida.

Palavras lindas, poesias;

palavras rudes, flechas mortais,

se cruzavam

enquanto meu coração angustiado

nada dizia.

Tudo o que se passava se perdia

por entre as frestas da fria solidão solitária:

cinquenta anos ali,

vivendo ao lado da mãe

possessiva, dominadora,

castrativa.

Acharam estranho

eu explodir

quando a mente repousava

em seu magma sombrio

e represado.

Retratos, poesias e memórias

em decomposição

voam destroçados

- partículas mórbidas

em suspensão

a dissolver a nossa história

- que escrevemos com suor

e sangue.

A morte vem nos dizer

que está viva ao nosso lado,

que nada somos,

que vamos trilhar o caminho

dos nossos antepassados.

A morte já sentenciou:

matar-nos-á sem piedade.

Escrever versos, falar de amor,

caminhar solitário por entre a gente,

escrever uma história...

O trabalho árduo, sério, solitário, duro,

que valor tem?

Sou apenas um homem distante de tantos meus,

diante de tantos eus.

Viverei comigo

e a companheira

o breve espaço

existente entre o agora

e onde terminará a vida.

NELSON MARZULLO TANGERINI.

2010.

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 21/04/2010
Código do texto: T2209567