E ELA NEM ERA MULHER SÓ SE CHAMAVA MARIA

E ELA NEM ERA MULHER, SÓ SE CHAMAVA MARIA.

Nasce protetora da vida, mas é menina; “É Maria!”

Diz o pai arreliado, pois um garoto queria.

E em criança já mostrava o que o futuro lhe daria

Fez-se forte, mas chorava quando o sol, por si, sumia.

E a pergunta que faria à infância, assustada,

Era o que fazer com o sangue que agora nela brotava?

E ela nem era Mulher, só se chamava Maria.

Seios grandes, pernas longas e olfato aguçado.

Puberdade, identidade, namoro, masturbação?

O que fazer dessa vida?

Tudo é tão aborrecido.

“Ninguém me entende, mamãe, que grande chateação!”

E a pergunta que faria à adolescência, assustada,

Era o que fazer com o feto que agora nela crescia?

E ela nem era Mulher, só se chamava Maria.

Outra criança viria para a vida proteger, nascera outra Maria.

Que chorava e não dormia.

Mingau, fraldas, mamadeiras.

Ai, meu Deus! Que agonia!

E a pergunta que faria a si mesmo, assustada,

Era o que fazer pra manter à tão indefesa cria?

E ela nem era Mulher, só se chamava Maria.

Pôs-se então a estudar, trabalhar durante o dia.

Muitas horas de labuta e muitos sonhos desprezados.

Sem parar nem um instante e só um cigarro a acalmava,

Quando a tristeza chovia em seus olhos tão cansados.

E nas preces que fazia para Deus, agradecida,

Do sofrimento passado e da alegria mantida

Daquele abraço da filha que para ela sorria

E ela ainda nem era Mulher, só se chamava Maria.