MARÍLIA PÊRA
CARTA-POEMA ENVIADA À MINHA MARÍLIA PÊRA,
QUANDO ELA ESTAVA EM PORTUGAL
COM OS PAIS
Marília, meiga sobrinha,
Recebi, com mil agrados,
Sua mimosa cartinha,
Cheia de “vinhos” e “fados”...
Cada frase ou oração
Tem um quê de original,
Pois nos toca o coração
Se nos fala em Portugal.
Esse distante país,
Plantado à beira do mar,
Só porque o destino quis,
Vive o Brasil a adorar.
É tal qual o pai que, ausente,
No olhar triste tendo um brilho,
Aguarda, ansiosamente,
Voltar a abraçar o filho...
Mas nos deixemos de histórias,
Minha sobrinha gentil,
Que estas coisas tão simplórias
´stão na “História do Brasil”...
Mudemos, pois de programa,
Que a verdade se propala...
O “luxinho” está na cama
E o Dindinho... nem se fala...
O “bruto” ronca a valer
Como sabe muito bem:
Parece um trem a gemer
Nas encostas de Belém...
As crianças têm pintado
Como quê, nesta avenida...
Vivem soltas um bocado,
Mas andam cheias de vida...
O Nirson passou de ano,
E o Nirtão, o “colossal”,
Anda agora a todo pano
Pra ir pro colegial...
O Tangerini e a Dinah
Vão muito bem, obrigado!
Ela está boa, ele está
Um “professor escolado”...
O Nirton passou o dia
Na rua, arrastando um carro...
E uma chorava, outra ria
A cada encontro, um esbarro...
Co´o “chofer”, rota a camisa,
Era tal a barafunda,
Que um furúnc´lo da Marisa...
Arrebentou, não confunda...
Mas suas cartas chegaram
Na ocasião bem propícia,
Pois todos se acomodaram,
Desde a Gracinha à Letícia...
E eis-me aqui a redigir
Em resposta à sua carta,
Para faze-la sorrir,
Se de saudade está farta...
Do Brasil, esse bilontra,
Sempre repleto de escolhos,
Quem dele longe se encontra
Sente um “argueiro” nos olhos...
Esse argueiro de que trato,
Quase ao léu e sem maldade,
É, em resumo, um retrato
Do que se chama Saudade!
Eu quisera me alongar
Nestas linhas; mas não posso:
Já são horas de deitar
E de sono me alvoroço...
Abraços mil no paizinho
E, na mamãe, outros tantos,
Distribua-os com carinho
Para torna-los mais santos.
Mil beijinhos das crianças
E dos demais, já se vê!
E um punhado de esperanças
Do titio... em você... (*)
Autor: Maurício Marzullo,
Advogado e poeta
12 de setembro de 1915, Rio de Janeiro, RJ;
17 de maio de 2008, Cabo Frio, RJ.
Ao meu querido e inesquecível tio Maurício Marzullo,
a homenagem do sobrinho e fã Nelson Marzullo Tangerini
(*) Publicado no jornal NOVA GAZETA, de Montijo, Portugal,
em abril de 2002.
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