No Mar

Sei o que dizer

Sei o que pensar

Mas assim não o faço

Apenas deixo ser

Apenas deixo estar

Uma de várias lições

A qual aprendi com o mar

Mar calmo e arredio

Mar forte e traiçoeiro

Mar, como eu, verdadeiro

Mar este que me prende

E hipnotiza-me por inteiro.

Mar que deu a vida

Ao mais sensacional humano

Um ser divinal,

Único, ímpar

Que assim como o mar que emerge

Traga e me suga

Acaba por exigir muito

Quase tudo

Tudo e mais um pouco

Deste corpo mambembe

Deste rosto marcado

Destas mãos que não agüentam, tremem

Destes pés que não sustentam, cedem.

Este alguém é você

Sim, você

Que desfila sóbrio por meus olhos ébrios

Que se banha claro nessas águas turvas

Que me encanta enquanto me desencanto

Corpo perfeito

Corpo Celestial

Astro ao meu redor

De luz intensa

Imprescindível

E assim, ineditamente

Pertenço ao teu eixo.

Eixo de idas e vindas que sigo freneticamente

Trechos de idas e voltas que acompanho diariamente.

Um vício, sim, um vício

Assim defino este mal que me persegue

Ou bem? Já nem sei

Não consigo parar.

Tua voz refinada e afinada

No meu íntimo se acolhe

O alívio de teu rosto

No meu vem se encontrar

No brilho fosco do teu olhar

Uma luz, um sinal

Olha pra cá, me repara

Faça-me orgulhar

Ou pra ti, este corpo, abominável será?

Com um simples aceno, que por sinal não vem

Sinto um afeto imaginário

Envolvo-me num criativo afago

Que tira todo meu fôlego

Que arranca minhas vísceras

Que me relaxa já em leito

Que consome a mim por completo

E embora não saibas

Sou teu há muito tempo.

Acredito que paciência

É um trunfo com o qual se pode contar

Acredito que sobrevivência

É algo a se necessitar

E sem ti não sei se sobrevivo

Assim, só me resta esperar

É cômodo

É fato.

Esperar por ti novamente

No seu vai e vem diário

No seu vem e vai privado

Que somente a mim pertence

Pois só a mim existe.

Conheço-te muito bem

Mas e você sabe quem sou?

Aliás, você sabe o que sou?

Se um dia soubesse, eu morreria.

Não sou teu

Não ainda

Nem sei ao certo se um dia serei

Mas certamente eu digo

Que de ti eu fui

Fui cada um dos dias das semanas passados

De ti eu sou

Sou cada uma das horas que não passam

No anseio de ver-te novamente

Mesmo que seja de longe.

Perfeição é algo pelo qual o ser humano prima

E trabalha arduamente para conseguir

Mas em teu caso, a perfeição veio de graça

Da graça dos teus sorrisos

Da graça dos teus cabelos

Algo pelos quais não há valor estimável a se pagar

Não ainda.

Pergunto-me porque não me enxergas

Será que sou invisível?

Sou eu intragável?

Infelizmente não sei

Algo ainda indefinível.

Deixo-me envolver por você

Deixo-me envolver pelo mar

Sou eu o animal homem?

Ou sou eu homem animal?

Nos mergulhos rasos

Nos tropeços fundos

Sinto calorosamente que nestas areias vivo

Ou nelas já estou enterrado?

Sinto-me como um ser inanimado

Um ser indefinido

Teu corpo seminu não se compara ao meu

Mesmo sendo contrário não sou igual, nem me pareço

Sou macho mas não homem, não pra ti

Sou animal mas não racional

Quer dizer, assim pensam.

Como ser racional ao ver-te?

Como não ser emotivo ao olhar-te?

Tenho vontade mas não me aproximo

Não sei como reagiria

Nem sei ao certo se permaneceria

Ao lado deste corpo

Ao lado deste suposto bicho.

De vidas passadas te conheço

De tempos antigos te reparo

Hoje não tenho a forma que me reconheces

Quando serei homem novamente? O homem ideal para você?

Nestas tantas reencarnações, desejo que retornes assim

Alegre sempre

Reencarnando cada sorriso, cada gesto meigo deste corpo lindo

Na praia te espero, não hoje

Muito menos amanhã

Na praia te espero eternamente

Desde que nós possamos ter um ao outro, mesmo que platonicamente

Ou na falta disso

Termos o mar

Pois só o mar sabe, assim como eu, apreciar-te

E só ele

Diferentemente de mim

Pode tocar-te.

Flavio Marcondes
Enviado por Flavio Marcondes em 18/02/2008
Reeditado em 28/01/2023
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