A VIDA E A MORTE

Professor e aluno sentados debaixo de uma macieira florida.

Nos fundos, a faculdade.

O aluno indaga:

- Professor, quem tem mais aventuras? A Vida ou a morte?

O mestre responde:

A Vida é livre, certa, confusa

Viaja, inventa, se muda, transmuta

A Vida floresce, esquece, se lembra

Corre, adoece, envelhece, enfrenta

É árvore, flor, fruto, semente

Que voa, que cai, apodrece e sente

Rasgar-se em broto. É ciclo, é crente

Nasce de novo. Nem sempre se entende.

A Vida explica, se mostra, se esconde

Planeja, se excita, copula aonde

Os olhos da morte não pode enxergar

Transforma a terra, a água e o ar.

A Vida se suja, se lava, conserta

Começa e termina, termina e começa

Alegra o mundo, corrige, tem pressa

Espera, espalha, ajunta, conecta

A Vida é linda, escreveu o poeta

A Vida escreveu o artista, a guerra

A Vida sangrou, escorreu pela terra

Acolheu, reformou, em silêncio ela berra

A Vida é gigante, ela chora, insondável

Sorri, se emociona, afaga, intocável

Faz-se presente a todo momento

E em toda parte viaja com o tempo

A Vida explora, participa, assiste

Aprende, ensina, comemora, desiste

Insiste que o Amor é único caminho

Enquanto recebe coroa de espinho

A Vida é forte, é frágil, contente

É sempre a culpada, sempre inocente

A mais rejeitada e inconsequente

Somente acredita e assim segue em frente

A Vida sacia, também passa fome

Fere e cura, a Vida é Homem

É mãe, é pai, irmão, é amigo

Parece tão longe. Está sempre contigo

A Vida prevê, avisa, liberta

Abre os olhos, às vezes te cega

Chama, escolhe, se encolhe, te esfrega

Perfuma, dá brilho e nunca te nega

A Vida é traída, partida, rasgada

Na luta com a morte pareceu derrotada

Perdoa, ajuda, mesmo machucada

A Vida é eterna em terna jornada

Multiplica, divide, soma, subtrai

Aceita o risco, mesmo tarde de mais

A Vida é Cristo contra satanás

...

A Vida não cabe num poema, uma prece

É o rio infinito onde tudo acontece

O aluno:

- E a morte?

A morte rasteja pela escuridão

Assusta, deforma, a bel perversão

Intoxica, polui, engana, se apossa

Domina, termina, atrapalha, faz fossa

É presa, incerta e muito astuta

Estagna, apodrece, adoece, disputa

Resseca, odeia, inveja, apaga

Persegue a Vida. É fria, malvada

Confunde, envenena e deixa sua marca

Tem teia, espinhos, gosma, ferroada

Feitiço, fedor e som gutural

É lesma, serpente, aranha letal

Parece inocente e até sensual

Mas tem garras e dentes. Se intitula “o mal”

A morte adentra grutas e cavernas

Se esconde, espreita, ataca, espera

Mata, arremata, devora, enterra

É ninfa, é dragão, vampira que erra

Bruxa maldita que vaga na terra

Profana, afana, vicia, encarcera

A morte é a mentira que mais desespera

Poucas palavras descrevem a morte

Não é infinita, não tem próprio nome

É sombra que some ao encontro da luz

Nas costas do Homem é mero capuz

Enquanto a Vida cria e converte

A morte não cria, mas tudo perverte

Responde, o professor.

O aluno suspira, estupefato:

- A Vida! A Vida!

Tartari
Enviado por Tartari em 24/02/2020
Reeditado em 26/11/2020
Código do texto: T6873181
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