CHUVA E EXPIAÇÃO

Borbulho nas minhas telhas

Era o céu que desabava

Numa chuva repentina

Enquanto tudo mais era silêncio

Naquela noite a humanidade dormia serena!

Senti a chuva como se fossem lágrimas

Tocando o meu mundo pelas frestas da alma

Senti-as escorrendo pelo meu rosto

Senti náusea e desconforto

Senti minhas fraquezas reveladas

Minha alma em prantos

Senti instado a pensar

Pensar na vida, pensar em Deus e nos homens

Sei que pensar na humanidade é entristecer

Que pensar em Deus é redimir

E que pensar na vida é me desentender

E desunir meu rebanho de esperanças

Eu que ainda creio em um mundo melhor

Na irmandade dos homens

Na vitória dos valores humanos

E que um dia, haveremos de achar um sistema justo de convivência

Creio na minha estranha forma de crer no inalcançável

Isto não se explica, mas me induz a crer que é preciso acreditar

Acreditar e olhar no espelho da verdade

E entender os quebra-cabeças das mentiras desmistificadas

Quando se desmancham os castelos da ignorância

Que movem a intransigência,

Creio na chuva fina da solidariedade molhando tudo

E removendo as pedras do egoísmo de nossa alma

Mas o barulho da chuva me devolve á realidade

Pus-me então de pé

Farto e melancólico

Em mim queimavam os fogos do universo

Lá fora a chuva insistia

A humanidade dormia serena

Serenamente dormia.