Ser Pobre
Dor de um desconhecido
Por todos que me conhecem
Atribuindo-me ninguém como nome
Para todos eles, eu nunca devia existir
E existo, porque me sobrevivo
Sou, de onde nem judas esqueceu as botas
Onde cheiros de latrina, podres
São nosso chão
E o céu, nosso tecto
E chove a benção da nossa miséria
Por dentro de nossas casas
Plantações de tsekis* aguadas
Fonte de comida para todo povo
E são nossas casas, habitação
Para milhares de pessoas
Paredes de zinco cansado
Donde saem as miúdas da noite
Balbuciando seus corpos de sustento
pelos semáforos da prostituição
E são nossos homens, os mesmos
Os ninguém que constroem cidades
Rendimentos precários
Um pão seco, um chá sem açúcar
Um desenvolvimento desfavorecido pela desgraça
E vivemos, sim, vivemos
Sem água de banho, tristeza, soruma
Vivemos, o desprezo do povo
Sem poder nada exigir
Pisando o pó que nem pisado merece ser
E anoitece,
Fazendo de nós frutos da solidão
E o amanhecer nos torna nus, pobres
Despe-nos as sujidades que vestimos
Desfilando pelas estradas de esmola
Pedintes do desespero
Sobre aflições da subsistência de nossos estômagos
O dinheiro nos falta
Mas nós não o faltamos
é a terra que nos enterra
e nos desperta o dia de amanhã.
Tseki: Ervas daninhas que nascem sobre as plantações e/ou até mesmo em qualquer local. São bastante usadas na gastronomia tipicamente moçambicana.