OUTONO
 
Nem ser jovem e belo:
O amor melhor é sempre dentro
E perto.
 — Lya Luft – Viagem.
 
 
1
 
Adormeceu-me o verão no vale das avenidas
Numa primavera sedentária — campo
Plácido da solidão, sossego de um recanto
Para o repouso dos ossos, das feridas...
 
O verão que se inclinou há pouco, entretanto
Vejo-o agora adormecer-se das batalhas amargas,
Das glórias inquestionáveis, missão
Derradeira de um conto de fadas
Num prenúncio (instante de despedida). 
Avistei meu remate — aceno sonolento de verão.
 
           
2
 
No crepúsculo, vem a misericórdia entardecida.
O crepúsculo traz brisas de perfume;
Quando, assim indulgente, maiúsculo,
Traz ainda bálsamos o crepúsculo;
Traz, sobretudo, meigas saudades da vida.
O crepúsculo é vermelho, um matiz
De carne, sangue incendiado, agressão...
Entretons de vermelho muito são,
Pinceladas ofensivas postas sobre cicatriz.
 
 
3


Adormeceu-me insano verão no vermelho
De um crepúsculo apinhado de cicatriz,
Ambição de calma secular, meu repouso.
A lua então se ergue. A última estrela se acende.
Antes do amanhecer, a noite às vezes surpreende:
Condena-me a noite a morrer aprendiz.
 
Minha noite inteira de fuga, no sono,
Restaura sonhos de amores doces, incríveis,
De afagos imaginários — que nunca os tive...
Manda abrir os olhos, acorda o meu outono.
 
 
4
 
Desperta-se num balouço risonho
O outono. (Redescobre-se num aposento sem parede.)
–Numa cor invasiva, ergue-se o outono, moço, verde.


*Poema inaugural do livro "Outono Verde"



 
Milton Moreira
Enviado por Milton Moreira em 24/09/2012
Código do texto: T3898650
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2012. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.