Canto à vida
Que seja eu a recolher
o primeiro perdão
na madrugada do teu rosto
na hora em que o galo cante.
Que haja um orvalho perfumado no jardim
e alguns seres alados
quando o sol se espreguiçar no horizonte.
Que as uvas formem mananciais
à cálices divinais.
E que as maçãs sejam sempre
as doçuras do céu
para todos os homens.
Que a espera da marcha das horas
seja absolutamente sagrada.
E que haja no ar um riso de meninada
e no rosto, um brilho de eternidade.
Que uma possível lágrima
seja considerada dádiva
e que escorra pela face
antes do anoitecer.
Que, quando acesa a chama,
à mesa, ponham-se todos,
mãos postas ao firmamento
cujo manto cobre o alimento
e dá força às costas.
E que no assoalho interior
dobrem-se joelhos de amor
a quem te deu o direito
de mais um dia viver.
(Direitos autorais reservados. Da série “Ventos e Cantos”, Rio de Janeiro, 1990)