APROPRIAÇÃO INDÉBITA
O portão lacrou o cadeado.
Não me reconhece mais.
Do outro lado, um novo morador
parece dominar a casa.
Não conhece a porta dos fundos;
entra e sai à mesma porta.
Deita na mesma rede que deitei.
Come e bebe o que eu plantei.
Arrota os beijos que foram meus
e se adona de onde ainda não saí.
Ela sabe que as mãos que passeiam
no seu corpo são as minhas.
Ela disfarça bem.
Ele dedilha uma canção,
ela lembra um poema que não fiz.
Eu recito o último em silêncio:
Ainda construo o meu sonho da morada
E na sacada, ao fim da tarde, sem demora,
Olhar pro céu e ver a noite enluarada
De eterna amada te chamar a toda hora.