A Erva Daninha e a Flor

A Erva Daninha e a Flor

Sou uma erva daninha

Num jardim encantado,

Por entre flores delicadas

Bem inserido e propagado,

Na luta pela sobrevivência

Vou buscando o meu traçado,

Sem licença, sem convite

Nem querido ou bem-amado,

Assim como um carrapicho

Num jardim bem planejado,

vou me alastrando por aí

A outros olhos mal-amado,

Se por entre pedras e espinhos

Eu não me sinto acanhado,

Quanto mais se bem nutrido

No jardim do "El Dorado",

Tanto menos poderia

Me sentir envergonhado,

Em lutar para ter dos céus

Um raio ensolarado,

Se por olhares e sorrisos

Venho sendo desdenhado,

Tudo isso só me faz

Ficar mais encorajado,

Diante mentes e corações

Que me queiram ter ceifado,

Do direito de estar

Por entre rosas perfilado,

Pois das cândidas camélias

Já sou até acusado,

Do seu raro perfume

Um pouco ter roubado,

Nem da exótica bromélia

Eu pude ser poupado,

Do seu convívio atraente

Em suas farpas me arranhado,

Nem por essas ou por outras

Assim sou rechaçado,

Se as alucinógenas papoulas

Não me têm derrubado,

Nem as graciosas azaléias

Tão pouco me encantado,

E de tulipas traiçoeiras

Vez por outra me esquivado,

Das margaridas tão mimosas

Me mantenho afastado,

Mal-me-quer ou bem-me-quer

Logo estou desconfiado,

Que cedo ou tarde desta terra

Poderei ser arrancado,

Se como erva imprudente

Assim sou encarado,

De cansansão ou urtigão

Até flor-do-cão sou denominado,

Nem aos "ibiscus" e "crisantemus"

Muito menos comparado,

Do dente-de-leão ao mangericão

Até do antúrio sou galhofado,

Nem ao desfrute de uma flor

Me sentir enamorado,

Pois às flores deste jardim

Quero dar o meu recado,

Flor-de-lís, flor-de-lótus

Flor do vale brumado,

Dos jardins da Babilônia

Jasmim do Cairo almiscarado,

Olhai as flores silvestres

Que estão por todo lado,

Flor do campo, flor do brejo

Da caatinga ou do cerrado,

Que convivem em harmonia

Com os espinhos no emaranhado,

Qual singela formosura

Do seu traço delicado,

Que crescem lado a lado

Com as ervas do pecado,

Assim são as puras flores

Do sertão ao descampado,

Das beldroegas e juremas

No seu leito ornamentado,

Sem deixar das suas fragrâncias

O verde vale perfumado,

Sem exitar que não seja eu

Dos seus aromas discriminado,

E para findar meus amores

Eu vos deixo o meu legado,

De um mero desconhecido

Por aqui enraizado,

Nem "ibiscus", nem "criantemus"

Ou antúrio consignado,

Sou apenas um carrapicho

Por uma flor, apaixonado...

Valdívio de Oliveira Correia Júnior, 18/01/2000