ALCOVA NATIMORTA

ALCOVA NATIMORTA

Trago no rosto o gosto doce do tempo,

enquanto amargo é o que vejo e me consome:

fome, abandono de idosos, corrupção.

O gosto do que gosto não é aposto,

é vocativo que exalta a leveza que o amor faculta.

Dentro de casa

acasala-se em mim o horizonte que encena:

o mundo dos bons

a música em vários tons;

Do agora não me resta ontens

nem do amanhã quero-me sabendo de hoje

Se agora me sucumbir a morte, sorte dela

Se da sorte só me restar o resto, réstea de mim

não se aparte de ti.

Do braço, o bracelete,

do gelo, o sorvete,

da boca, a gargalhada,

de Pilatos, a mão lavada.

Não temo as pegadas do tempo

Não tremo no espelho nem busco fuga

Se tenho vida

se tenho tudo, que importa dor que de mim não fuga?

Que importa solidão se em mim não gruda?

Que importa a porta

se não voltas para alcova natimorta

do que um dia nunca fomos?