Enchente

Correm afora as águas que afogam

Do abismo redemoinhos de gritos

Do espanto em que se jogam

Desabrigados indefesos e aflitos

A água tudo arrasta com ferocidade

Destruindo o que encontra pela frente

Seguindo intrépida em velocidade

Engolindo ruas, casas e gente

Tudo em volta é semente de agonia

A desolação torna-se companheira

Do buraco obscuro em que se principia

A enchente traiçoeira

Barrancos, pontes e estradas

Nuvens de frio e de lama

Transformam-se em hostis moradas

De um povo sem teto e sem cama

Rio abaixo e rio acima tudo se esvai

Estabilidade construída com muito esforço

Como em um passe de mágica cai

E desaparece em meio ao alvoroço

Construir tudo novamente é sina

Dos que conseguiram a vida salvar

E é essa a alegria que ilumina

Quem pode pelo menos recomeçar

Igual a ave fênix, das cinzas renascer

Engolir a lágrima que teima cair no rosto

Olhar para frente e para o amanhecer

Que minimiza a decepção e o desgosto

Pobres ou ricos não importa

A sorte agora abraça a cada qual

A solidariedade humana é que conforta

Todo pesadelo e todo mal

Voltar às origens e limpar o vendaval

Os entulhos e os restos deixados

Espalhados pelo temporal

Em todos os cantos e em todos os lados

Prosseguir é palavra imperativa

Levantar tijolos, vigas e massa

Gente heróica e combativa

Sabe que tudo passa