Não tenho medo...
Não tenho medo da morte, ela me espreita,
Há muito tempo com seu rosto sorridente...
- “Eu sou o fim das dores, da saudade...
Deixa-me levar-te à tua morada!”...
- Não! Senta aí! Tomemos um café...
Tenho bolinhos de chuva, recém feitos!...
Conta-me como estás em tuas andanças
E como te recebem os que alcanças!...
A digna senhora se sentou
E à mesa, o seu rosto me mostrou.
Sim, era um rosto sorridente...
Mas como era triste o seu sorriso! Docemente
Contou-me o quanto vive só; que as pessoas,
A grande maioria dos mortais só tem-lhe medo,
Não percebem o quanto ela é formosa
E gentil em sua missão de ceifadeira...
Corta o fio de prata ternamente,
Termina com a dor e o sofrimento
E leva os seus mortos, mansamente,
À Terra dos Regatos Murmurantes...
Terra coberta, o solo de diamantes,
Os jardins com as flores, as mais belas!
Oferta roupas novas, e as fragrâncias
Das flores misturam-se àquelas
Canções... Dá vestes alvas àqueles
Que a acompanham sem ter medo...
Há crianças, animaizinhos, muitas flores
E música no Novo Lar! E lá, os amores,
Os amores revivem na morada,
Não se separam, são parte um do outro!
E ela fica feliz ao vê-los lá
Pois muitas vezes leva um antes do outro...
Sua mão alva pediu-me então um chá,
Pois não gosta de café: é estimulante,
E ela precisa manter-se muito calma
Para acalmar seus parceiros murmurantes...
Dói-lhe ver o quanto sofrem de saudade
Os que ficam, quando leva-lhes seu par...
- Não entendo! Não sabem que é fugaz
A trajetória dos que vêm passar aqui?... -
E duas lágrimas rolam de sua face
Alva como a neve dos invernos,
Geladas, tristes pelo medo dos infernos!
- Eu não vou até lá, murmura ela;
Esses eu deixo à sombra do caminho
Para que se revejam, tais quais passarinhos,
Que não souberam o seu ninho construir...
Depois eu volto e mostro-lhes sua vida...
Reflito com eles, sobre todas as partidas
E todos os sofrimentos que causaram...
Alguns se arrependem nesta hora
E recebo a missão de conduzi-los...
Ou outro Alguém vem para auxiliá-los
A crescerem e suas vidas construírem...
Cai-lhe o Manto, ela veste cor de rosa
É como é linda em seu corpo esguio...
- Não tenhas medo quando chegue tua hora... -
Ela é como mãe que nos seguiu
À vida afora, desde que nascemos,
É o nosso Anjo que à Terra conduziu...
E depois volta, para acabar sua jornada
E mostrar-nos que ainda há longa estrada,
Feliz, a percorrer...
Não penses tu que a Morte é o Nada:
Ela é o Caminho para o bem viver...
Fica tranqüilo, não há o que temer...
Agradeceu-me o chá. E foi-se sem demora...
- Voltarei quando chegar a tua hora!... –
E sorrindo despediu-se e foi embora...
Uma rosa lilás deixou à mesa
Em agrado por ter-lhe dado a certeza
De que a acompanharei sem medo agora!...