TRACTATUS... II (01).- Prefiro tornar baças... // Porém, ardo e estalo...
António Gil Hernández.
TRACTATUS DE EUPHEMICA DICTIONE -II-
Variações sobre o poemário
'Inteiro silêncio',
de Cristina de Mello.
Caminho, Lisboa, 2006.
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Acrunha, Maio de 2008
Cristina (de Mello) cara:
Deste-me em Acrunha [The Corunna] o teu (segundo?) poemário,
INTEIRO SILÊNCIO.
Lembras?
Foi em 13 de Fevereiro de 2008, depois de um emotivo recitado
de poemas teus, mas sobretudo depois de um encontro, ainda mais emotivo, teu comigo: tu e eu...
Passaram... quantos anos? Mas mormente passaram...
Quantos acontecimentos? Em ti, nos teus... E em mim, nos meus.
Dedicas-mo:
«Ao António Gil Hernández,
não querido, muito
querido amigo, com
imensa alegria e
afecto, por este encontro
emocionante.
Cris.
A Corunha, 13/2/80.»
Decerto foi emocionante: O facto de nos vermos, o abraço que se seguiu e mesmo as lágrimas que nos intercambiamos: abertas, nédias, as tuas; vergonhentas (os homens não choram!), as minhas.
Mas, agora que estou a reviver aqueles minutos intensos, sinto que o coração e o cérebro sofrem estranhos e felizes tremores...
Por isso, apesar de tudo, os versos deste poemário inverso vão dedicados a ti, apenas a ti, a ecoarem aquele estremecimento.
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I
Prefiro tornar baças
as dores pretéritas ou presentes:
submetê-las à tortura do «precipício»,
vencidas pelo prazer dobrado no corpo.
E não andar entre desassossegos
topados nos lugares do alcatrão:
Tatear carne e não muros,
mesmo a minha,
sem frescura, sem viço, sem cor, sem beleza:
arada pelos anos sem quase horizonte...
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II
Porém, ardo e estalo
como faísca musical acesa em “impromptus”:
dedilho barragens breves a inundarem velhas
verdades «que nenhum violoncelo mitiga».
Porque o grito sulca mares supliciados
que anjos inclementes
sementam com ondas de prazer retido
e espumejantes luzes virginais.