Lírio de uma tarde de outono

Quinta feira. Chove no céu escurecido.

As gotas caem gélidas na pedra fria

Sem fogo na lareira. Tristes lágrimas de um amor ensandecido

As colinas somem na névoa do meio-dia

Lírio

Que balança sozinho ao vento

Na imensidão soturna de um cemitério

E descansa em paz ao relento

Lápides ressaltam o triste ar de mistério

Onde a chuva bate silenciosamente

Onde descanso inconscientemente

Lírio

Tão comum

Cercado de anjos altos

É só um

Perdido na imensidão dos planaltos

Solitário como a alma

Lírio que aos poucos falece

Sonhador que pela simplicidade acalma

Lírio que na solidão cresce

Túmulo onde jaz minha vida

Túmulo onde enterrei minha ferida

Leva também a minha alma

E enterre-a na mais serena calma

Lírio que não me ajuda a esquecer

Leva-me contigo em teu caminho sem fim

Tudo o que na vida tive de sofrer

Lava para dentro das lápides a desilusão em mim

Além de um olhar

Há o passo de um coração a não mais amar

Chuva que cai pelo meu corpo

Frio que aos poucos toma conta do momento

Veneno que devagar me torna louco

Frio como as lápides sem alento

Simples como um lírio ao vento

Já é chegada a hora de se deixar levar

Já é chegada a hora de chegar

E quem sabe até a hora de voltar

Para que eu possa ver mais uma vez o teu olhar

Lírio de uma tarde de outono

Mausoléu de desprezo e abandono

A mente descansa aos poucos e adormece

A chuva piora aos poucos e me esquece

Lírio de uma tarde no túmulo ao relento. Sonhos se deixam levar.

Lírio que leva meu sofrimento. Lembrança de quando parei de amar.