O vulto à bruma

À noite, contemplando a relva em ondas,

Nas ameias que encimam o castelo,

Ana Luísa escorre sobre as pontas

De seus cabelos lágrimas ao velo.

E pensa, sob a bruma -- que desfronda

Dos bosques, pessegueiros c'o sincelo --,

'Vistar um cavaleiro que se esconda

'Quanto apeia o tordilho de seu celo.

Descrê, contudo dos próprios ardis

E orvalha à bruma sôfrega, infeliz,

Gélidas serenatas delirantes.

Plissando mais um pouco o cenho em pranto

Concebe, Ana Luísa que, no entanto,

O vulto não passara d'um cervante.

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Ameias: parapeitos separados por merlões

Sincelo: pedaços de gelo pensos sob as árvores

Cervante: o mesmo que cervo

Tordilho: refere-se ao cavalo negro

Raquel Minchetti
Enviado por Raquel Minchetti em 05/10/2024
Reeditado em 09/10/2024
Código do texto: T8167263
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