Morrendo de tédio I: A Cicuta
Mate-me as dez em ponto.
Dê-me duas doses de cicuta.
Penso que devo morrer
Logo que entornar a primeira dose.
A segunda é para minha garantia
Ou para alguém que queira me acompanhar.
Por favor, logo que debruçar meus olhos
E minha alma sob o tempo eterno,
Deite-me na rua,
Em meio ao trânsito
Para que saibam quando passarem
Pelo meu corpo frio e estendido
Que jaz um homem infeliz pelo seu tempo
Se ninguém parar diante disso
Empurre-me para de baixo de um caminhão
Meu corpo dilacerado, com certeza, chamará mais atenção.
Afinal a desgraça e os destroços
Sempre param os homens.
Quando for mutilado este corpo que ainda fala quente,
Estarei olhando da calçada
As figuras e as vozes de homens, mulheres e criancinha:
“– Tinha de ser assim para morrer?”
E eu rirei de seus olhos piedosos:
“– Eu já estava morto”.