O MEU ÚLTIMO ABRIL
Que você viesse esperei o tempo inteiro,
e esperando vivi dia e noite, noite e dia,
por anos a fio, de janeiro a janeiro.
Mas neste ano você prometeu que viria!
O meu último Abril seria o mais bonito!,
nutria eu a esperança mais certa.
Logo cedo tirei da parede O Grito
e o escondi no peito, deixando a porta aberta.
Aquela muda boca aberta enfeava o ambiente
e eu queria o dezesseis mais bonito,
para que quando você viesse finalmente,
fosse aquele nosso Abril o mais claro e inaudito.
Tudo decorei de luzes e de flores,
de cores e luzes tremeluzentes.
As mesas repletas de sabores
e música por todo o ambiente.
Assim, de pura luz, eu queria o meu último Abril.
Os outros tinham sido tão escuros e tão feios!
Mas também daquela festa o sol fugiu:
esperei o tempo inteiro, anoiteceu, mas você não veio!
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"Abril é o mais cruel dos meses' pois 'germina lilases da terra morta, mistura memória e desejo, aviva agônicas raízes com a chuva da primavera".
Foi num distante Abril que nasci e é sempre e recorrentemente em Abril que caio em mim e lembro que "não sou nada, nunca serei nada, não posso querer ser nada".
Mas tento crer que, "à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo".
No entanto, sabendo que é inútil ter sonhos e não saber ou não mais dispor de tempo para realizar um único deles, volto a lembrar que "um homem velho é apenas uma ninharia, trapos numa bengala à espera do final, a menos que a alma aplauda, cante e ainda ria sobre os farrapos do seu hábito mortal".
E eu, logo eu, eu que há tanto tempo não ouço aplausos, eu que só levei pancada, eu que "nunca conheci quem tivesse levado porrada na vida. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo", menos eu.
"Eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, indesculpavelmente sujo..." Será que só eu não sou gente? "Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo? Então só eu que é vil e errôneo nesta terra?" Os meus amigos, "poderão as mulheres não os terem amado, eles podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!"
Ridículos como eu, nunca! Abril é o mais cruel dos meses, pois foi em Abril que nasci. Mas o que importa tudo, se tudo passará, se eu passarei, se você passará, se os rios e mares passarão, se passarão as nuvens, se os passarinhos passarão, se passarão os pássaros pequenos, os pássaros grandes passarão, se tudo passará, se "todos esses que aí estão atravancando o meu caminho, eles passarão... eu passarinho!", se eu passarei, se, enfim, mais um Abril passará?
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O MEU ÚLTIMO ABRIL é um dos poemas do meu livro "Para uma Nova Era, Poesia & Prosa" (Editora Patuá, 2019) -