lá fora
alguma coisa acontece
lá fora
ouço gritos ouço passos
e permaneço inerte
em silêncio
porque hei de me levantar
e percorrer os labirintos
que não me levam a lugar algum?
para que me levantar
e participar do tumulto que se faz lá fora?
ouço um gemido
não
ouço vários gemidos
o que será?
talvez o meu vizinho esteja sofrendo
talvez
lá fora
fora de minha percepção
os passos inquietos procuram procuram...
e eu aqui isolado
por que não ouso erguer?
aqui fico ouvindo o barulho que se faz lá fora...
bastaria um simples movimento
e atiraria para longe o cobertor que me cobre.
com outro movimento ficaria de pé
de frente a porta
levantaria a mão e tocaria o trinco...
é só rodar a chave e a porta ficará aberta...
com um leve movimento ela estará totalmente aberta
e um longo corredor surgirá
percorrerei silenciosamente e em seguida
estarei lá fora
no meio do barulho
junto ao tumulto
jundo das pessoas...
e aí então
talvez
eu consiga compreender...
mas nesse momento
justo nesse momento
uma preguiça
nada mais que uma preguiça invade meu corpo
então me cubro dos pés à cabeça
e concluo que nada tenho a fazer
lá fora...
com tamanho cansaço
durmo um sono profundo
Poema (escrito na década de 70) do livro Três Estações - edição do autor - 1987