O Ultimo Poeta
É tudo suposição, dissonância
Tudo incerto e vagas lembranças
Quem me dera ser eu um livro aberto
Para que alguém pudesse ler
E perceber a importância
De se olhar atento ao verso
De quem conjectura sobre o morrer
E da amargura no beber
Mas gostaria de ser uma taça
Para que alguém me preenchesse
E o fim se extendesse, pois se me entendesse
Seria bom viver
Sem o semblante da desgraça
E sem que precisasse me esconder
Ou chorar nesse imenso precipício
Sem fazer da mente refúgio ou hospício
E das lacunas meu interior
Ou pirar nos delírios e devaneios
E ver nos sorrisos alheios
Motivos para se ter dor
Da lonjura de um solstício
Talvez só haja mesmo precipício
Nesse mundo sem cor
Sou como um borrão de tinta
Na parede de um casarão
E quando chove lá fora
O mundo aqui de dentro cai no chão
Como um sopro cansado de quem sofreu
Pondo em linhas retas versos tortos
Espelhando poemas mortos
Que a humanidade se esqueceu
Verdades doloridas
E mentiras coloridas
E meu mais sincero
Pavor da vida
E das pessoas — como sal na ferida
Nem ruins nem boas
Apenas... Pessoas.
E dentro da infinidade do tempo
E da eternidade das horas
Dias finitos, que logo se vão embora
Que por mais longínquo a demora
E os dias de tormento
Apenas...Dias; Apenas... horas.
Eu não resido no meu sorriso
Tampouco no meu chorar
Não sei onde findar abrigo
Não sei onde fica meu lar, ou pior
Se tenho algum, mas apesar do pesar
Tenho pensado em um lugar melhor.
Um lugar sem pessoas;
Um lugar sem dias;
Um lugar sem horas.
Pois não sou livro, nem sou taça
Ninguém me lê; ninguém me preenche
Intranscritivel — vazio
Humano.
Reles humano.
Amordaçado
Encarcerado
Dilacerado
Mesquinho.
Estradas sem caminho
E de escuridão sem fim
Vivo acanhado dentro de mim
Gritando calado.
Falando sozinho.