ELEGIA I
I
Meus olhos, ínsitos vigilantes
São atentamente vigiados
Por penetrantes flertes visórios.
Com a premissa de que sou intimidavél
Semblantes austeros aprofundam
Seus olhares em minha direção.
Mas com o intento cínico de entrete-los
Dirijo-os ao nada, de modo cênico
Refletindo-os em sua própria vastidão.
II
Como um sonhador
Não grafo-me as vísceras no tempo.
Fingidor da noite enferma!
Oculto na etérea matéria
Inexata de um sólido ego.
Eternizado o momento:
Descubra o que penso
Escrevendo o que escrevo
Sem a mínima intervenção carnal dos homens
E assim, livre da influição de seus olhares insones
Que vigiam-me, na cata de contemplar minhas verdades
E dentre elas encontrar sofismáticas ambiguidades
Na forma de mentiras enraizadas, em alcovas desmedidas
Que boicotam-me a razão acerca das coisas tangíveis
Como corrompida a percepção lúcida pela sombra entorpecida.
III
Talvez não sejas o mal de vosso tempo
Talvez não o sejas de todo mal:
Esta insolente necessidade
De falar-se junto à recusa de ouvir-los.
Mas em tal indiferença displicente
Tornamo-nos narcisos
Eco(ando) no próprio reflexo osco e débil.
Todos somos nós
E todos são só a si mesmos, diante de todos
Mas vendo somente à si, de bom agouro.
IV
As mãos trêmulas, tão gélidas
Vacilam na tentação provinda
Da fenda aberta que nos escoa afeições
Entre a intenção e o gesto, antes tidas.
Há muito
Perdemo-nos
Entre o desejo e a satisfação.
Perdemo-nos
Na inerte conjectura dos fatos prometidos.
Perdemo-nos na promessa mesma
No esquecimento
Antes!
Perdemo-nos
Na lembrança apenas do que está por vir
Sem de nada antes fazermos provir.
V
Já não pertence-nos quem seremos:
Seríamos!
Mediante a diluição de quem fomos:
Agora
Quem somos?
Assim ruímo-nos!
O tempo presente, o ideal das leis
Tiraniza ao homem moderno
O amarga e insignifica.
E deste modo seguimos
Sem saber de que modo - para medrar
Novamente seguirmo-nos.
VI
Como explicar consumada erosão
A datar do conseguinte pó já dissipado?
Só oque perdura é uma intacta questão
Pulsante no tempo, tal qualquer indagação
Conquanto, inda intacta e subjetiva
Mantém-se sobre a turva vista
Ávida por medos imaculados
E d'onde tragicamente
Ei-lo de prover nossa crível ruína
O sacro predicado:
Nada és tão certo que não possa estar errado.