Infeliz das Três Porteiras
Eis a pequena história verdadeira
Do peregrino e pobre Pedro Berno,
Chamado de Infeliz das Três Porteiras
– Infeliz das Três Porteiras do Inferno.
O nascimento deu-lhe o tolo fado
De ter um corpo alicerçado em dores,
De ser mais um dos entes condenados
Ao mecanismo estranho dos horrores.
P'ra Berno a vida foi somente breu,
Somente bulha e brenha e bordoada.
Comeu bem pouco, e o pouco que comeu
Beirava sempre as margens do no-nada.
O que o manteve a persistir na vida,
Senão o instinto de sobrevivência,
Catar prazeres, poucas e perdidas
Migalhas vãs das grãs e vãs carências?
Voltou, por fim, à eterna escuridão
De onde saíra desde o nascimento:
Morreu, sozinho, vendo o rumo vão
Dos passos seus, sangrando o sofrimento.
Nascer, viver e então ter que morrer
São certamente aquelas três porteiras
– Três tapas tristes, tapas sem porquê,
Filhos da estranha trama das besteiras!