OSSO DURO

Caminhava pelas ruas

muito faminto e desolado

feito um cão sem dono,

com a alma seminua

e tremendamente desconsolado

num total abandono,

quando passei por perto

de uma casa de carnes,

onde a atendente, me olhou sorrindo,

mostrando-me todo o seu charme.

E assim como em um alvoroço,

meu coração bateu acelerado,

por pensar que dentro daquele vestido,

apertadinho e em seu corpo colado,

continha algo, que me fazia perder os sentidos.

Aproximei-me mais um pouco,

daquela menina sorridente,

e ainda meio no sufoco,

fazendo ares de contente,

retribui lhe o sorriso, fingindo,

que estava tudo muito bem.

O que, porem, eu mais queria,

era matar minha fome.

Pois viver sem ninguém,

sozinho e sem alegria,

eu acho até, que não me convem.

Então, estique meu faminto olhar,

sobre aquelas carnes expostas,

ali, cada uma em seu devido lugar,

onde a fome já estava posta.

E assim lambendo os lábios,

cheio de muita fome,

julgue-me um pouco sábio,

pelo desejo que me consome.

Fui aproximando-me um pouco mais,

atraído por aquele sorriso,

que as carnes macias, decorava,

sem perceber que jamais,

ter atenção era preciso,

pois algo mais me esperava.

Assim, já devorava mentalmente,

aquelas carnes virgens.

Na minha fome infinita,

percebi que realmente,

eu estava tendo vertigens

de um mal bem recente.

Mas, mesmo assim, tentei ganhar,

um pedacinho de maçã de peito

ou quiçá, coxas,

para que eu pudesse alimentar,

minh’alma que de fome, roxa,

encontrava-se cheia de defeitos.

Então a moça do açougue,

perguntou-me o que eu queria,

para levar pra casa.

Foi ai que eu soube,

que dinheiro no bolso, não havia,

nem mesmo para acender as brasas.

E sem saber o que lhe dizer,

perguntei lhe simplesmente,

se ela não teria um pedaço de osso,

para a fome do meu cachorro, satisfazer.

Ela por sua vez sorridente,

disse-me: - Olha seu moço,

vou lhe dar este aqui, ta bom?

E os meus olhos agradecidos,

tornaram se radiantes,

por verem aquele osso carnudo,

que a mim, era oferecido.

Assim num suspiro profundo,

senti-me mais aliviado,

por pensar no quanto seria bom,

saborear aquele osso, na hora do almoço.

Muito agradecido por tudo,

despedi-me daquela escultura humana,

que ali vendia carnes saudáveis,

durante toda a semana.

Meus olhos, Porém, insaciáveis,

encantados ficaram perdidos,

no momento daquele adeus,

por saber que dentro daquele vestido,

que eu deixava atrás do balcão,

encontra se os sonhos meus,

de fazer uma boa refeição.

Mas, mesmo contra minha vontade,

fui saindo de mancinho, devagarzinho.

Sem fazer qualquer alarde.

Peguei o osso que dela ganhei

e coloquei-o dentro do paletó,

sem ao menos embrulhá-lo.

E por tantas ruas caminhei,

novamente desolado, tão só.

E sem alternativa para assá-lo,

assim fui andando pelas ruas,

ainda faminto e sozinho,

feito um cão sem dono,

com a alma seminua.

Quando já me encontrava,

longe de tudo e bem distante,

na periferia da cidade,

lembrei-me de que eu caminhava,

para o nada, e naquele instante,

de abandono e sem mais nenhuma vaidade,

descobri que não tinha mais,

por onde seguir meu caminho.

E tremendamente desolado,

num total abandono,

fiz como os animais.

Aconcheguei-me em um cantinho,

na escuridão de um casarão abandonado.

E assim, como um cão sem dono,

fui comer meu osso duro,

ali, bem longe daquelas carnes,

num devastado abandono

e carente daquele sorriso cheio de charme.

Nova Serrana (MG), 26 de agosto de 2009.

Tadeu Lobo
Enviado por Tadeu Lobo em 17/02/2017
Código do texto: T5915581
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