Mais uma última vez...
Esta é a última vez que penso em você,
uma última vez que povoas minhas lembranças,
remexes meus sentimentos como ondas revoltas,
fazes de meu interior uma arena para anjos e demônios,
acirrando guerras constantes por um troféu de vidro,
sim, esta é uma última vez de uma desilusão solitária,
considerando as lágrimas que tenho vertido na escuridão,
considerando os pesadelos que roubam meu sono,
considerando a ausência de paz em meus gestos,
não quero mais ser assolado por tal punição,
pois já paguei meus pecados em cada sopro de vida,
deixando-me chicotear ao vento de uma terrível tempestade,
cegando-me nos raios de uma ira sem perdão,
fui devidamente castigado pelos pecados de outrora,
agora vago tateando pelas paredes, em busca de mim mesmo,
mas saibas que eu a esperei por cada segundo respirado,
imaginei seu retorno nas contas de cada dia ultrapassado,
acendendo a lareira em cada inverno de nevascas intensas,
mantive as roseiras do quintal florescendo em cada primavera,
recolhi as folhas secas em todos os outonos,
e no final não houve sequer uma carta ou um telefonema,
não houve uma palavra que pudesse me consolar,
então, vamos à uma última vez de despedidas indiferentes,
enquanto termino de afinar o piano onde compus suas músicas,
clamando nas melodias a inspiração de musas encantadas,
poetizando teu rosto em notas tocadas com esmero,
para desafinar no último ato sem espectadores,
encerrando esse concerto com uma última canção,
no dedilhar de uma crônica perda de sentido...