Aparecestes...

Aparecestes então depois de um longo inverno,

sem calor algum em suas mãos geladas pela ausência,

trataste-me como alguém sem qualquer significado,

um estranho nas areias de um deserto de sentimentos,

alguém em quem se esbarra numa esquina qualquer,

sem sequer preocupar-se em pedir desculpas,

alguém a quem se pergunta uma informação,

sem sequer parar um segundo para olhar nos olhos,

falastes rapidamente de sua vida, sem grandes brechas,

perguntastes dos meus dias sem muita empatia,

deixando-se ser apenas educada após tanto tempo,

esperando uma porta para escapar daquele instante...

Mostraste-me como os danos da solidão são incuráveis,

como os sons emudecem no correr da indiferença,

como os corações param de bater no escuro da alma,

como os amores são despedaçados sem saudades latentes...

Aparecestes então como um fantasma que retorna dos mortos,

sem qualquer vontade de reatar antigas emoções,

trataste-me como um colega distante a quem se esquece fácil,

um peão sem valor no tabuleiro de um jogo de xadrez,

alguém por quem se passa sem notar a existência,

sem sequer perceber o perfume que outrora a encantou,

alguém que tornou-se apenas mais um dos tijolos da construção,

sem sequer identificar as marcas de expressão as quais acariciou,

dissestes algumas poucas palavras no virar do minuto de um relógio,

mantivestes sua capa impermeável forjada no chumbo dos meses,

cobrindo de gelo e espinhos o espaço entre nossos pés descalços,

desejando não estar ali mais do que eu aguardava esse reencontro...