DIÁRIO DE UM MUTILADO
I
Surgi do caos, de um gesto das alturas,
dos átomos errantes da atmosfera;
alimentei as grandes criaturas,
personagens históricas de uma era.
Direcionei Noé a terra à vista;
dei a Moisés as dicas da vitória;
fiz o rio, onde um tal João Batista
mereceu um capítulo na História.
Glorifiquei o Herdeiro dessas terras:
( o Anjo que caminhara sobre mim )
... Mas Roma herdou a tática das guerras,
tão logo a minha paz chegara ao fim.
Mesmo modificado e reduzido,
até hoje resisto com firmeza
ao progresso que a séculos tem sido,
o predador da minha natureza.
II
O sol! A lua! Esculpem meu cenário,
estimulando os ímpios truculentos
a fazer meu sagrado santuário,
transformar-se num palco para eventos.
Mas não se encante ao ver tanta beleza;
trago o mal de Narciso nas entranhas:
visto de fora sou "Madre Tereza";
mas dentro, sou um rio de piranhas.
O avanço tecnológico fornece
resultados precisos ao medir;
como se o Deus Satélite pudesse
prever as multifaces do porvir.
Milhões de Titanics imponentes
já lançaram grilhões no céu de lama:
Muitos estão na cova de indigentes,
poucos estão no mausoléu da fama.