O Grito

Um baque de porta

contra a casa seca e muda.

Nos degraus sem retorno

da calçada estéril,

o homem do grito

deforma-se no paletó fosco

como quem espera um susto,

esconde na boca o tabaco em tubo

qual as cinzas esquerdas pré-acesas

mergulham pelo vento intruso

das múltiplas ruas molhadas pela invalidez

No tempo que gira:

a órbita ocular

absorve o véu noturno

repleto de fusões nucleares

e o seu escuro, sempre em navalha,

sangra a hemorragia do bom senso e

estréia pegadas fracas

em direção aos bairros cotidianos

Noites boêmias

noites caducas

liberdade

ecoam gritos, vícios,

mocidade.

Órgãos em falência induzida

almas distribuídas aleatoriamente

pelas mesas dos bares em blues sinestésicos,

suas escalas graves improvisadas

harmonizam a teoria da noite aguda

e do grito, áspero, pagão

visceral

Na hora:

-não ao pensamento. Que a noite seja minha despedida!

(Pólvora em forma de barulho)

O homem do grito, gritou.

E nunca mais ouviu-se grito algum.

Heitor de Lima
Enviado por Heitor de Lima em 20/04/2014
Código do texto: T4775464
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