Velhice no Brasil
Veja minhas mãos. Não, não olhe para meu rosto, esqueça do meu corpo.
Atenção, olhe para minhas mãos e eu te explico: Vê esses dedos postos
Nessas mãos, onde se vê pele elástica, veias, artérias à mostra, é a tal
Velhice que chega aos poucos e assusta no começo com os primeiros fios
Brancos de cabelo, mas depois devagar, gradativamente, sem pressa nos
Envolve como uma aranha envolve sua presa em seus fios de seda, então
Tudo é questão de tempo. Meu rosto e meu corpo não fogem ao processo
Degenerativo. Sou agora velho. Sonhos? Não existem mais. Família?
Não nos querem de verdade, somos todos, os velhos, lastros de navios
Lançados fora para aliviar certo peso para que a viagem continue. A vida,
Mas que vida? Sou livro lido, quiçá tenha deixado alguma lição. Sou jornal
De ontem, informação passada, desatualizada, sem valor para o hoje, mas
Sinto inveja, pois mesmo assim tem serventias: É forro de chão, cobertor,
Abrigo de mendigo. Não, não olhe para meu rosto. Olhe para essas mãos,
Que sequer conseguem justapostas ficarem para agradecer pela vida que
Tive e para pedir fervorosamente : Senhor Deus, perdoe-me por tanto
Rancor e reclamações mil, mas é que ficar velho dói, sim a velhice dói,
Principalmente aqui no Brasil.