O poema mal esclarecido
Este é aquele tipo de poema que a gente escreve por escrever.
Aquele poema que nem parece um poema, nem o que forçamos a rima.
É aquele texto de guardanapo velho, da mente insana pelo uísque barato.
Aquele embaralhar de palavras, na brincadeira com a filha.
Proso: Noite é do homem; manhã é da mulher
E dessa liberdade faço rima aonde eu quiser. Mas esta não,
Foi coincidência! Há algo por trás dessa inocente aparência.
Texto bom é texto com rima. Faço rima até com rima!
Perco-me no meio termo, onde estava eu em meu texto?
Encontro-me no início de uma terceira estrofe, e nada tenho
Além de um monte de rimas "pobre" — Liberdade poética!
Pedra; Tijolo; Casa; Lar. Texto ruim que em sua interpretação
Dará em um bom lugar! Ah, que fácil é vida de poeta, rima com rima
E acaba como profeta. Perdemos o poema outra vez; Encontro-o,
E vejo que agora fugiu o sentido do começo da conversa. Quantas rimas!
Estou perdido em palavras soltas, Noite, lar, rima com mar.
Espero que pensem que tem significado, pois não o tem.
Serei demitido do trabalho de poeta, confessei o outro lado da moeda.
O poema são palavras, o significado são falácias. Você os fez, não eu.
(meu trabalho é rimar)
Cá estou, aqui em baixo deste poema ralo, que para muitos está
Entre os mais sábios. Já disse sobre fadas e camelos, também
Política e modelos! Tudo nestas pequenas estrofes. Também
Critiquei o amor, e afugentei a dor. Já aqui clamei pavor.
Disse tudo, sem escrever nada. É teu mérito tamanha imaginação.
Pois o poeta não é ninguém sem você para fazê-lo gênio.
É você quem glorifica o texto fraco e menospreza o texto épico,
É você quem traz desprezo e é você quem traz sucesso.
O poeta é o que você, leitor pretensioso, faz dele.
Enchendo-o de desprezo pelo texto perfeito;
Regando-lhe glórias pelo texto vazio.
Tudo depende de você, Dono deste mundo!
Cuspir-me-hão por essa estrofe que se segue,
Pois não haverá beleza nem bom-senso, nem rima que se preze.
Em diante vos escrevo o calcanhar de Aquiles dos poetas perversos
— Quanta teimosia!
...
Desculpem-me a pausa, hora do lanche.
Como vos disse, é poema escrito por escrever. Gozo agora
De tamanha relação, tudo está encaixado, um desfecho quase épico
Ao que parecia uma auto-condenação da imagem de bom poeta.
Agora, ao fim de uma cansativa leitura, vês que
Nada vos disse com essas tantas palavras vazias.
Vês que, ao que se resume esta poesia, uma poesia,
O poema depende — e vive — pela tua interpretação.
Chego ao possível término desse labirinto de palavras.
O que devo fazer? Um final metafórico para que o leitor se acanhe
A fim de desvendar a trama desta obra? É uma boa! Mas não aqui,
Neste poema de guardanapo velho e banho matutino.
Você, que leu esse emaranhado, saiba que aqui vos mostro
A fonte de inspiração, e a grandiosidade dessa trama só depende
Do tamanho da tua mente. Se caso vivo por isso, dependo de você.
Dependo dessa tua incrível façanha de transformar isto em Hamlet.
Agora aqui, nestas últimas linhas, arrasado pela minha própria
Difamação, eufemismo de minha parte dizer que há dualidade.
Minha poesia torna-se sua obra, e desta eu que levo a Glória.
Faça Arte dessa sujeira!
Desmascarado, estou clamando que esse devaneio que me fez escrever-lhes
Esse poema desapareça, para que eu faça cinzas desta verdade.
Pois assim eu, tomado por gênio pela criatividade do teu Eu, continuarei
a jogar-lhes rimas chulas, e destas faremos Besteira e Arte.