Drama Etéreo
O sol não vai brilhar amanhã
E serei enterrada com uma mortalha de números
Pois os sentimentos foram sufocados muito tempo atrás
E só restaram dados frios, vazios
Sou uma sombra
Despida de tudo aquilo que importa
Incapaz de chorar, incapaz de sorrir
E - agonia! - incapaz de morrer
Sonhem, vivam, amem
Esqueçam a alma semi-transparente
Que atormenta suas horas
Sumirei logo
Se os deuses em quem nunca acreditei
Se apiedarem de mim
Volto ao nada de onde vim
Sem muito o que dizer
Sem muitos arrependimentos a elencar
Não sou nada, sou vento
Sou alguma coisa etérea ocupando espaço
E não quero ver o sol nascer amanhã
Deixem-me dormir num canto escuro
Deixem-me cultivar a solidão mórbida
Que escolhi teimosamente
Por medo dos incompreensíveis sorrisos humanos
Deixem-me afundar em minha tristeza
Talvez eu consiga chorar dessa vez
Talvez eu consiga sangrar
Até acreditar que também sou humana
Não quero suas mãos estendidas
Não quero um anjo da guarda
Não tenho paciência para dramas
Nem mesmo para os meus dramas
Só queria chorar, gritar e espernear
O mais rápido possível
Até tudo isso acabar
Não me importa para onde irei depois
A apatia destruiu o medo
Junto com todo o resto
Ah, meus queridos humanos
Meros fantasmas em meu drama etéreo
Eu não sentirei falta de vocês
Não sentirei falta de suas rotinas medíocres
De seus sonhos pequenos
De suas reclamações sem motivo
Não sentirei falta da forma idiota como odeiam
Nem da forma egoísta como amam
Não me importo com as coisas tolas que constroem
Acreditando deixar um legado grandioso
Aos descendentes que se corroerão com as mesmas perguntas
Que lhes tiram o sono
Nada é relevante
As perguntas são longas, as respostas são cíclicas
E quando o sol nascer amanhã
Não me acorde