A um ausente

Tenho razão de sentir saudade,

tenho razão de te acusar.

Houve um pacto implicito que rompeste

e sem te despedires foste embora.

Detonaste o pacto.

Detonaste a vida geral, a comum aquiescência

de viver e explorar os rumos da obscuridade

sem prazo sem consulta sem provocação

até o limite das folhas caídas na bora de cair.

Antecipaste a hora.

Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.

Que poderiam ter feito de mais grave

do que o ato sem continuação, o ato em si,

o ato que não ousamos nem sabemos ousar

porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,

de nossa convivência em falas camaradas,

simples apertos de mãos, nem isso, voz

modulando olhares silabas conhecidas e banais

que eram sempre certeza e segurança

Sim, tenho saudade

Sim, acuso-te porque fizeste

o não previsto nas leis da amizade e da natureza

nem deixaste sequer o direito de indagar

porque o fizeste, porque te foste.