EU ERA

Eu era

Quem me conheceu de outrora, esqueça!

Eu mudei, andei por caminhos e tropecei

Levantei,

Mas ao me erguer aprendi a deixar o pé

Para que outro tropece e caia também

Eu era lindo, absolutamente lindo

Mas deformei essa minha beleza

Maquiei-me com todo egoísmo

E com sorrisos comprados

Eu vesti a inocência

E escancarei pré-requisitos

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu de ontem, perceba!

Eu calei, fechei meu coração e me guardei

Banalizei

Fingi emoções para seduzir os amores

E assim ofertar hipócritas emoções

Eu era poeta, verdadeiramente poeta

Mas rabisquei todos os meus versos

Rasurei com minha ganância

E com palavras decoradas

Eu enxuguei minhas lágrimas

E debulhei-me em sarcasmos

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu do passado, apague!

Eu sequei, matei minha vida e ressuscitei

Ignorei

Encolhi o braço para não socorrer

E deixei no chão quem eu poderia erguer

Eu era gente, indiscutivelmente humano

Mas apunhalei as minhas sensações

Enterrei-a com os meus vieses

E com gestos ensaiados

Eu adormeci todo o onírico

E acordei os meus instintos

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

Quem me conheceu de antes, entenda!

Eu pequei, jurei em vão e me neguei

Crucifiquei

Injuriei o meu melhor e mais bonito

Para dar vazão ao esdrúxulo

Eu era tudo, um Apolo de sentimentos

Mas apedrejei todo o meu eu

Troquei-me por um vazio

E por coisas tangíveis

Eu derrubei meus devaneios

E ergui o homem de hoje

Sou o rascunho do que eu era

O borrão na aquarela de outrora

Sou o que não quero

E agora?

Agora vendo sorrisos que fabrico

MÁRIO PATERNOSTRO