Tédio
Tenho tédio de mim
Desta forma madura
Destes traços sem rumo
Destes gestos sem prumo
Tenho tédio de mim
Deste cabelo sem graça
Deste excesso de massa
Desta falta de raça
Tenho tédio de mim
Desta face imutável
Deste tempo inegável
Deste casulo inevitável
Tenho tédio de mim
Dos pensamentos previstos
Das palavras presumidas
De tudo calculado
Tenho tédio de mim
Dos lugares prováveis
Dos projetos estáveis
Dos sonhos intocáveis
Tenho tédio de mim
Da visão tão notável
Da alma impenetrável
Que mantenho inviolável
Tenho tédio de mim
A perseguir os mesmos planos
A traçar os mesmos marcos
A atormentar os mesmos donos
Tenho tédio de mim
A induzir os mesmos erros
A acreditar que há conserto
Pros cacos que há em mim
Tenho tédio de mim
A programar o mesmo dia
A contar as pilherias
E acabar em nostalgia
Tenho tédio de mim
A buscar o mesmo amigo
Ter um livro como abrigo
Se sentir como um mendigo
Tenho tédio de mim
Tenho a vida como castigo
Tenho o tempo como inimigo
Cansei de viver comigo.