O ENFORCADO
Naquela noite pela alta madrugada
o prisioneiro em sua cela dormitava
quando um algoz, cara vendada, ali entrava
dizendo em alta voz que a hora era chegada.
O nosso homem levantou-se angustiado
deitando a mão ao seu colchão humedecido
e com voz cavernosa disse entristecido:
- agarra esta escritura, nela vai meu fado.
De seguida vestiu um largo paletó
e com seu peito aberto caminhou sem norte
p’ lo interminável corredor de nome “morte”
com trémula passada que metia dó.
Desalinhada barba, rosto de alma negra,
de olhos furibundos, gestos agressivos,
era bem o tal homem, d’ entre os mortos vivos,
a fiel imagem do enforcado sem entrega.
Aquele homem que um dia ousou contrariar
a bem organizada força do Ocidente
subiu ao cadafalso, rosto assaz pendente,
para seus crimes com justiça expiar...
Perante a nota de leitura que foi lida
seguiu-se um instante de silêncio e horror
o abismo abriu-se sob o corpo em estertor
ficando ali suspensa aquela triste vida...
Esta justiça foi o exemplo bem gritante
daquilo que os humanos mostram com eventos:
vender a honra por prestígio e por talentos
dá glória e mais poder ao Estado triunfante.
Surgem por todo o lado vozes lamentáveis
uns a favor e outros contra protestando
mais valera que agora fossem observando
em suas vidas gestos e actos igualáveis !
Frassino Machado
In AS MINHAS ANDANÇAS