Incompatibilidade Musical
Naquele dia, depois de tantos meses de relacionamento,
você se revelou um "castrado roqueiro de carteirinha".
Ligou a vitrola e disse :
— Estou farto de tanta frustração! Chega !
— Estou cansado de fingir que adoro tudo
para agradar ao pai, à mãe, à namorada
e à torcida de todos os times...
E, batendo na borda da mesa, com a mão quase fechada,
esbravejou:
— "Rock para que te quero"
e quem estiver incomodado que se dane,
pois, a partir de hoje, vou ser eu mesmo.
— A minha paciência se esgotou ...
A música estrondosa tomou conta da casa
e das casas vizinhas.
Meus ouvidos estalavam,
como estalava o excesso de decibéis
espalhados por todos os lados.
Eu fiquei atordoada, sem saber o que pensar
sobre sua repentina mudança,
e me senti num mundo estupidamente diferente do meu:
não que não goste de rock, mas, naquela altura,
não há quem agüente ouvir, a não ser você.
Você monopolizou os meus ouvidos
e os ouvidos de toda a redondeza,
com o seu som ensurdecedor.
Quase sem raciocinar,
magoada com sua mudança brusca,
no mesmo dia, ainda atônita pelo desconforto auditivo,
sentindo-me vencida pelo barulho de um rock qualquer,
arrumei as malas e sai blasfemando,
sem sequer ser ouvida por você.
E, muitos dias depois,
estávamos definitivamente separados
" Por in-com-pa-ti-bi-li-da-de musical"...
Maria Nascimento Santos Carvalho