Lenço Negro

Hoje vai ser assim, roupa nova

Tudo novo?

A expectativa de se achar no abraço com o alheio

É confortante até o confronto verdadeiro

O miúdo braço contornando uma criança atormentada

Faz-se forte, mas num enlaço nem sempre total

Lenço negro da noite, pintado sobre o corpo que dorme

Ainda sob as telhas macias, quais caem e não se vê que cortam

Cortam pernas, pensamentos … cortam meninos, cortam máquinas

Essa ponte eu-universo feita de pedidos

Cravada com meu ouro e meu cansaço

Pois tudo cansa, e é tão falho

Um século de existência bem sucedida, pressupõe muita decepção pelo caminho

Não pretendo me arrastar, ou me conceder final sem meio

Porém mentir e não sentir, já não faz parte do que é ser

Já vesti todas essas roupas que proclamam o “ser normal” …

E a que melhor me serviu está na sala, vendo TV e assassinando o futuro.

Daniel Sena Pires - Lenço Negro (13/04/2011)