Lábios Adormecidos
Lábios Adormecidos
Ela dormiu antes do final do filme
Adormeceu sem entender a profundidade do romance.
Pegou no sono sem perceber que o filme
Do nosso romance pode ter chegado ao final.
Ela não gravou as frases ambíguas únicas,
Que de tão tímidas são as mais charmosas,
Não botando reparo no aviso cintilante
Dos últimos olhos.
Ela não inferiu a ironia dos obstáculos
O fulgor dos primeiros beijos
Não assistiu, não aprendeu
Que o Amor só tem esse nome
Pelas provas que é capaz de fornecer
Pelos tortuosos caminhos que percorre
Até a delícia do infinito
Cujo talvez não passe de amanhã
Mas que se derrete nos lábios da dúvida.
Por ser noite, o cansaço lhe abraçou
Antes da minha afinada eloqüência
Que ensaiava inveja e inspiração
Através do filme de final esperado
Nem por isso menos mágico
E revoltante pela solidão áspera
Das intempéries da sua ausência
Viva ausência adormecida.
Ela não viu, por fim, a loira menina
De gorro vermelho que beijava
O rapaz de cabelo comprido
Na lentidão da última cena
Ela não quis substituir os atores
Ou refazer a história
Ela dormiu antes do final
Sem notar a profundidade do romance.