Teoria da conspiração
Se
a vida não for mais que um sopro
e o sopro perder sua força, sua essência,
se a tarde se desfizer em desvarios
ou a noite trouxer homens esquálidos da guerra
se procurarem meu corpo onde por horas me deitei
e em meu lugar estiver uma calma quase nauseante,
se todo o esforço for em vão
e a culpa correr nas veias como esparso sangue
se cercarem meus sentimentos e memórias
dentro daquilo que senti mistério,
se as flores todas caírem como treva
se a treva for mais alta que o silêncio
se tudo conspirar contra minha palavra,
me calo
e torno ausente meu repertório de idéias
insanidades programadas
matematicamente em seleto sonho,
se
o poeta se enforcar na cozinha
a poetisa sufocar-se com gás
o artista disparar contra a têmpora
se eu mesmo ficar tão cansado
que desejar um deserto sem água nem vida
para caminhar,
se tudo acabar e nem uma mágoa restar
estarei calado
estaticamente
e toda a matéria que forma meu corpo
pó resoluto e complacente
se esvair
juntar-se ao vento e agitar as palmeiras
dum paraíso distante,
se
a criança chorar sem pai ou mãe
e buscarem a mim, um esboço de poeta
na tarde que ofega em pranto
na brisa que desliza em sono
estarei aqui
calado.