Poética - Psicografia

"Quando o mundo apagou não havia velas e a única luz fustigava oca na inexprimível combustão do tempo - a eternidade era o momento presente e todos jaziam presos nela, sem enxergar o passado ou cogitar o futuro."

Não me lembro de onde vim e nem como voltar, pois esqueci-me de mim no próprio ato de pensar.

No escuro as retinas dispersam

minha luz para um prisma donde todas as experiências atravessam-me e somem.

Por ora escrevo e não enxergo as linhas, quiça registro a vida passar, apenas me perco a medida em que coloco-te para fora -

Ao escrever peneiro sua forma, separando-te em camadas e deixando que surja como és e tome meu lugar.

Se te invoco, é porque olhei-te através de mim e te fiz caber em sonhos dos quais jamais me desprendi; se desperto, contudo, é para que finalmente te permita existir.

Deixo que fales longe da luz, - prematura e tardia - inventando-se no instante em que nasce e se esquecendo da tua origem antes de morrer dentro de mim.

Na distância platônica não sabes que morreu nem em que paraíso se perdeu, apenas vaga longínqua no brilho eterno e cego da ignorância.

Quem sabes se tu és uma ideia ou pessoa? Se quando abro os olhos todos os deuses deixam de existir?

Se te perturbo, é porque vivo,

e os vivos assombram tudo o que desvaneceu, em um pecado contra a efemeridade.

Tu que não tens consciência de mim, logo não tem a quem rezar, tu que outrora etérea existiu nos templos da minha mente.

Tens medo da vida?

Acho que temo por ti.

Agora apenas procuro-te no além de mim, terrena, bela e incerta, muito mais do que um dia concebi, assim, deixo-te ateia, descrente do meu existir.

- Letícia Sales

Instagram literário: @hecate533

Letícia Sales
Enviado por Letícia Sales em 14/11/2024
Código do texto: T8196523
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