O amor duvidoso

“não quero namorar agora”, eis a frase mais enganosa do mundo,

nunca é de fato literal.

nela o não-querer tem uma condição, e a condição é quem escuta tal sentença.

não é que não se queira efetivamente namorar,

todos querem namorar!

o ponto é que não namoramos quem não queremos, não quando.

o quando em verdade não interessa a ninguém;

quem quer, quer, não importa quando.

mas não dizemos, sobretudo se somos mulher, que não queremos,

e quem não queremos;

não dizemos que não queremos namorar você, ou seja lá quem for a pobre alma,

e nem dizemos quem não queremos namorar: você.

o “não quero namorar agora” peca pelo exagero;

e mulheres exageram em tudo;

são tanto as criaturas mais próximas do paraíso,

quanto são as mais próximas dos fogos escaldantes e labaredas do inferno!

isso depende tão só se elas nos amam ou nos desprezam;

se nos amam a vida é éden!

se nos desprezam, purgatório.

“não quero namorar agora”...

o “não” já serviria para matar as esperanças do amante, do amador;

“não quero” também, apesar de longo.

mas o “namorar agora” no final de tão simples frase é o que nos faz encher o copo com as lágrimas salgadas de todos os amantes da humanidade;

é clara e inequivocamente a garantia de que os bares sempre irão ter clientes,

e os poetas, ah… os poetas coisas para escreverem.

“não quero namorar agora”...

‘Se deixou claro que é agora o não querer, será que, então, quem sabe futuramente, o não querer poderia, sob a graça de todos os santos - até os que não casam ninguém -, se transformar apenas em querer?’ - questiona o amante.

ele, se não estivesse amando, saberia quão patéticos são seus questionamentos!

quão patético o é ele próprio, a se alimentar de incertezas.

A esperança cega o homem apaixonado.

ele enxerga sims nos talvezes

e talvezes nos nãos.

a razão nos diz para abandonar o barco que afunda,

mas o capitão, que é amante do barco, prefere morrer junto a largar o objeto de seu amor.

um naufrágio tem sempre algo de demonstração de amor;

a morte ali não é apenas morte, é também entregar-se todo a outrem,

vivo ou morto.

O amante é estúpido numa semelhante proporção.

ele morre no amor que sente por ela;

Ele naufraga nas ondas de incerteza que o objeto amado o faz ter.

“não quero namorar agora”...

ele, o amante, espera o agora passar.

às vezes levam dias e semanas,

às vezes meses e anos.

o agora acaba realmente passando.

ela namora, sim! Agora ela namora!

com outro.

O que se ouve sair dos lábios desejados é “não quero namorar agora”;

O que se deveria entender: “não quero namorar você”.

quem ama não consegue entender bem o que é dito,

e não diz bem o que entende.

Amar parece ser a arte das incertezas;

daí o amante viver de incertezas.

a única certeza do amante é seu amor.

12 de junho de 2024, Natal/RN

Carlus Augustus
Enviado por Carlus Augustus em 01/08/2024
Código do texto: T8119931
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