Anastácia pensar em silêncios
Pensar em silêncios
É lembrar da escrava
Anastácia
Amordaçada
Não pode falar
Não pode comer
Nós negros
Na vida curta temos
Não poucas vezes
Temos que silenciar
Ficarmos calados
Engolir o choro
Ou chorar na cama ou no
Travesseiro
Lugar quente
Muitas vezes ouvimos
Insultos
De patrões, autoridades
Próximos e distantes
Nossa vida é ceifada
Retiram a vida de nossos filhos
As mães gritam e choram
E ainda querem elas fiquem caladas
Querem amordaçar mais
Anastácia
Enquanto vivermos
Podem ser as crueldades continuarão
Porém, vamos falar
Gritar, espernear
Não vai ser fácil sermos ouvidos
No entanto, na curta existência
Temos
Nos calamos, às vezes, por amordaçamentos
E gritamos, falamos
Mesmo que teimem em não nos escutar
Por não reconhecerem a nossa humanidade
Somente pela cor preta da nossa pele
Anastácia
Fala por muito tempo depois da vida
Basta vermos
Sua face amordaçada e sentirmos
Como fala com os
Olhos penetrantes
Já disse Nina Simone
Tenho voz, tenho mãos, tenho pés
Tenho olhos
Tenho corpo
E mesmo não tendo mais corpo
Vamos continuar gritando contra as
Injustiças
Seculares.
(À propósito da polêmica contra a escola de Samba Vai-Vai no Carnaval paulista no anos de 2024)
Rodison Roberto Santos
São Paulo, 17 de fevereiro de 2024