eu, e o Barba Azul

(essa poesia foi inspirada em um conto do livro Mulheres que correm com os lobos)

Por muito tempo

Fiquei castrada

Na minha tagarelice

Que te incomodava

Tentei conter

Minha gargalhada

Minha voz alta

Os meus excessos

Tão incompreendidos

Pela tua perspectiva

Fala.

Silenciei

Calei

Engoli as palavras

Adoeci aos poucos

Já não me reconhecia

Nem mesmo me importava

Eu só me esforçava

Em não ser eu

Pra te agradar

Não te machucar

Com minha inadequação

Com a falta de trato

Minha feiúra escancarada.

Eu não era boa

O suficiente

Nem para mim

Nem para você

Nem para meus amigos.

Eu era um protótipo

Algo sem vida

Fabricada para atender desejos

Sem se rebelar

Apenas aceitar

Performar

As coisas certas

A programação incorporada

Sem dar bug

Curto-circuito

Uma robô

Com peças instaladas

Fragmentadas

Pelo trauma

E quando me dei por mim

Estava oxidada

Virei sucata

Entulho de lixo.

Precisei recolher toda a tralha

Reciclar tantas partes de mim

Em uma nova construção do eu

Já cheio de ranhuras

E de segunda mão

Porém mais forte

Aprendi a mecânica do abuso

A engrenagem que a faz girar

Mas não,

Essa carcaça não está à venda

Estou calibrada

Não vou ser controlada

Por comandos alheios

Eu mesma me refaço

Me monto inteira

Sem manual de instruções

De homem abusador

Alheio.

Bruna Larissa Nogueira
Enviado por Bruna Larissa Nogueira em 21/07/2020
Código do texto: T7012171
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