CANÇÃO DO MARGINAL!
– Eu sou o povo!
Venho de longe...
Venho de longe tão cansado e triste...
Eu sou a plebe! Eu sou um marginal!
Eu sou o coração da alma nacional!
A minha casa é um caixão de lixo!
e o meu telhado, um saco de aniagem...
Não tenho nada!
Mas tenho a liberdade, o amor e o sofrimento...
Alentos desta vida!
Ouço ao longe um grito de amargura...
É a mãe da minha gente;
é a minha pátria amada
chorando de desgosto à minha desventura...!
E sob o látego de ódios virulentos
ouço a voz do capataz
– Trabalha! Trabalha negro!
E ao compasso dos ritmos metálicos
sinto n’alma o coração industrial...
Minh’alma se revolta em convulsões de angústia...
Meu corpo se estremece em convulsões de amor...
E então eu vou cantando tristemente
sob a máscara de alegre Carnaval:
– Chiquita bacana
Lá da Martinica!
Se veste com uma casca
de banana nanica...!
Eu canto e rio pra afogar a mágoa
do sonho que morreu...
– Que importa a desdita da existência?
– Que importa que eu morra ou que padeça...?
os meus irmãos bebem meu sangue
que é o suor da produção...!
E este gigante que mora dentro d’alma
estremece e marcha no progresso
sobre o cadáver da plebe esfaimada...
E as taças de vinho espumejante
tirintilando nos palácios majestosos
são a música irônica de um hino
– Um novo Hino Nacional!
(Rio Grande-RS, 1947)