Não Venha, Ainda
Não Venha, Ainda
Não venha, ainda! Não há esperanças para recomeçar,
as portas estão enferrujadas e janelas cerradas para amar.
Não ative seus desejos, o sorriso do retrato é montagem,
um adesivo à venda na banca da vida para ludibriar.
Minh’ alma ingênua merecia seus afagos verdadeiros,
não aquele alçapão de amarguras e puro engodo.
Não venha, ainda! Da eminente tragédia devo alertá-lo,
mude o trajeto dos sonhos, os meus debandaram.
Não venha, ainda! A seiva que era doce em fel mudou,
nem sei nem se há reversão nas veias dilatadas de dor.
Melhor não ficar à espreita com esperanças de habitar,
coração abarrotado de decepções, amarguras e bolor.
Procure alguém que acredite no seu pobre glossário
porque em mim só encontrará o niilismo embrutecido.
Eis minha última palavra: não quero nada, além disso,
restou-me apenas o embuste da matéria sem atrativo!
Não venha, ainda! É ilusória a imagem de outrora,
há Sodoma no meu corpo com o fascínio de Gomorra.
Venha à meia noite no portal da colheita do orvalho,
pronto para pegar com a alma todas as Cartas in Flor,
e dá-las aos pedintes de Amor que as saibam decifrar.
Fragmento do livro FLORBELA, NÃO EU
Tributo a Florbela Espanca