Ártemis e a corça
28/5/2017
Hoje, com tudo o que passou
Descubro que nunca me vistes
Como me vejo, e realmente sou.
As memórias são demasiadamente tristes,
Armadilhas, chamados, tuas armas atraentes:
Com as tuas mãos algozes me feristes.
Mesmo depois de toda a possível distância
Sinto a tua enorme, ancestral e maligna ânsia
A tentar me adestrar, condenar e punir-me em minha vacância.
E assim, longe, não podes me tocar e nem me ferir.
Você agoniza e caça a languida corça, que nunca existiu.
Por mais que tente, não terá conquista o teu extorquir,
Não há horizonte para ti, preso no ciclo do abuso.
Vejo ainda que tudo o que você podia ser e ter de viril
Está entrelaçado à frustração de sua submissão em alto uso.
Não há “ser” para ti, além das paredes da fantasia inútil
Na qual me prendestes e tornastes prometeu punida.
Eu não sou o que planejastes para mim neste teu ardil.
Teu chefe, teu pai, o policial, o presidente, os teus superiores
Mandam em ti, e você obedece por medo e todos os seus pudores,
Puxa o saco, submete-se, capacha-se, coloca-se em cólicas e horrores,
E hoje não há mais o meu EU que montastes na tua jaula,
Aquela que não tinha filhos para girar a roda do abuso,
Aquela a quem o seu mal retia, até que tu me deste uma aula:
Do que é o amor e a posse. E foi caindo, então, em débil desuso
A fantasia que vestiras em mim, pois a tua máscara de arlequim
Caiu da frente da arma e eu pude desviar, enfim, dessa cíclica bala
Que tornava a minha existência um turvo tom de coagulado carmim.
Ser Prometeu punida não é minha sina, grotesco reprodutor de sistemas,
Fênix, Deusa, Ártemis, Frida, Marie Curie... estes são meus melhores dilemas.