Demolições internas
Você sempre disse que me amava. Mas no fundo nós sabíamos que eu poderia até ser o seu amor, contudo, seu coração sempre procurava outros amores, amores menos complicado que o meu. E eu até incentivava, pois sabia que você precisava ser feliz.
Você então voou para longe de mim, o que me partiu o coração. Aí voltou para exibir ela, seu novo amor.
Você pode até tentar me provocar ciúmes, dizer que ela é linda (e ela é mesmo), enumera características físicas que ela tem e eu não. Só que eu te mostrarei a minha beleza interna. Falarei dos meus livros, das minhas lutas diárias, dos meus sonhos e um pouco sobre Álvares Azevedo, que você só conhece por meus livros empoeirados.
Não satisfeito, você irá além. Vai levá-la na festa de nosso amigo em comum, pois sabe que eu vou. Desfilará com ela diversas vezes na minha frente e eu terei que engolir em seco palavrões quilométricos (e olha que eu não xingo, e achava feio quando você fazia isso, mas a ocasião pede). Só que eu não deixarei transparecer em minha face a minha frustação e indignação. Não darei mais a você o poder de me ler. Só que eu sei que posso não me controlar se beber. Mas o que será caras e bocas perto do que eu sinto e que eu sei que você ainda sente também?
Só que já deu. Pode para de fingir essa felicidade toda. Sai dessa. Hoje o seu olhar me disse tudo. Revelou a sua saudade de mim. Me contou a sua saudade de conversar comigo. Me disse que você sente falta das minhas broncas e conselhos. Seu olhar me disse, de forma amedrontada e confusa, que eu ainda domino os teus pensamentos. A minha lembrança te incomodou ao relembrar o meu sorriso e de todas as besteiras que eu falo descontraída. A minha proximidade te fez arrepiar ao lembrar dos nossos beijos intensos e minha voz rouca sussurrando em teu ouvido.
Deixou claro que você cansou de andar em círculos e sempre voltar a girar na minha órbita, enquanto eu finjo que não vejo. Enquanto você sente e se assusta por não saber o que fazer com esse sentimento que cada dia cresce e lateja. Não adianta fugir. Pois para onde for, sentirá que só estando ao meu lado se sentirá novamente completo.
Contudo, você é teimoso. Não quer admite o que sente de verdade.
Eu só quero te dizer uma coisa: o tempo vai passar. Teu café vai esfriar na distração de buscar algo que ficou comigo, enquanto o meu vai esquentar regado de tardes chuvosas e literatura ultrarromântica. Se o nome dela for diferente do meu nome, você terá problemas por não conseguir lembrar. Se eu não esquecer o seu, terá sorte por eu ainda não ter decidido te deixar sair da minha vida pela porta da frente.
Você vai me ver passar e te lançar um olhar de relance, com uma pitada de imposição e autoconfiança. Chutará pedrinhas enquanto volta para casa, descarregando sua frustação por não me atingir como gostaria. E eu vou recolhê-las, pois é o que faço com os escombros das minhas demolições internas. Eu sempre reconstruo tudo, pois assim me torno mais forte.
Você me olhará novamente, demoradamente. Eu seguirei o teu olhar como um ímã. Tentaremos no encaixar na marra, na força, na persistência, de algum jeito. Serei a sua sombra.
Mesmo que você toque outra canção e eu escute com o sarcasmo de alguém que já ouvi a mesma música há quatro anos.
De que forma, haverá uma ligação.
Um olhar no meu.
Um andar de mãos dadas.
Sua vida na minha.
As xícaras no mesmo lugar, com um restinho de café.
O coração na boca.
Emoção a flor da pele.
Um dia semivivido marcado no calendário.