Dos amores antigos, nunca esquecidos

Não entendo por que tu continuas a pairar

Sobre o meu coração

Como uma sombra antiga,

Continuas a manchar a minha memória

Como tinta fresca,

Resistes em meus sonhos como se

Eu tivesse te tocado ontem,

Sorrindo como se tivesse sido ontem

E falando-me coisas que eu podia

Ter ouvido ontem.

Mas não,

Eu não te vejo já há muito tempo,

Eu mal sei quem és.

Não sei da tua voz

Nem da tua risada,

Eu não me lembro mais do teu toque

Nem do teu beijo.

Minhas lembranças dos teus olhos

A essa altura das nossas vidas, são escassas.

Mas alguma coisa sobrevive

Intocada em um relicário,

Imortal como um santo,

Indestrutível como o infinito.

E lá essa coisa vive suas dores

De não poder bradar, tampouco calar.

Bem, eu não entendo

O motivo de eu não conseguir

Arrancar a flor que plantaste,

Já que, lembro-me bem,

O fizeste de maneira displicente

Quase não a regaste, e tantas vezes

Ela quase morreu.

Mesmo com tão pouco alimento,

Ela ainda é capaz de deslumbrar

Olhos desiludidos

Ainda é capaz de ferir com seus espinhos,

Ainda faz diferença no meu jardim.

E tudo isso, ao meu contragosto,

Acredite,

Sobreviveu em virtude

Da força daqueles dias

De beijos sussurados,

De esperanças juvenis,

De umas poucas palavras de amor.

Pergunto-me se a minha lembrança

Ainda forma, ao menos, uma gota

Dentro do teu oceano passado,

Ou se eu fui apenas mais uma onda

Que nem sequer a rocha conseguiu atingir

Antes, dissipou-se em espuma e silêncio

Agora eu te vejo distraído

Absorto em sua própria vida

E então percebo

Como sou vil por estar aqui

Derramando-me secretamente

Espalhando minhas dores

Deixando que a lama

Ou a água cristalina,

Seja lá o que forem essas lembranças represadas,

Rompa com fúria esse recanto inatingível de mim mesmo

Inunde-me, cubra-me.

Quero um pedaço de terra seco

E quando penso nisso, compreendo

Que foi você quem remou para longe

Deixando-me à vontade para atracar

Onde quisesse.

Pois bem,

Hoje estou em terra firme.

Porém, daqui ainda avisto

O teu lago sempre tão calmo e brilhante,

Tão fértil e cristalino.