Café individual

Teus cabelos já foram meu hasteio,

Meus meios, objetivos a alcançar

Nas pontas já tiveram graça,

Leveza, paciência, tudo passa

Inclusive teus cabelos a balançar

Teus olhos foram portos de esperança

Tragavam-me sempre quando quiseram

Eu continuo bem te vi sorrateiro

Esgueirando lépido e fagueiro

Pelas brumas de tuas janelas

Mas que alma já tivesses, quão bela!

Quando pensares em mim que seja

Com o pudor lastimável de uma viúva

Lembrar de dores é salutar, lembras de mim?

E que chores um pouco, hei de lavar

Minh'alma quantas vezes for possível

Ó mar meu, quanto de teu sal seriam

Lágrimas reptilianas desse animal

Hoje me vejo sem amarras,

Liberdade me deu asas

À penas de mim, eu-alado, fênix viril

Teimosa insiste em sempre

Sobrevoar cinzas de outrem

E se os ventos fossem sopros do Criador

Eu ainda hei de indagá-lo

Onde estava minha cabeça?

Senhor, tal encontro seria lufada ou escarro?

A hora da partida é chegada,

Ora, ora, tempo, tempo

Anos dourados já foram mais lustrosos

Ó metal fosco de mim...

Enquanto rechaçavas com um cuspe

Outros vinham me limpar

É melhor olhares para não relembrar

Se hoje me chamas de tresloucado, parabéns!

Foi a parte que me cabia de nós

Foi a fatia mais mesquinha de mim

E deixaste-me levar embora,

Permitiu botar porta afora,

Flagelos sem noção de egos,

O que eu estava fazendo ali?

Deixo-te a sorte companheira de vida

Deixo-te o amargo do café, a bebida

Levo o filtro para não esquecer

O quanto deixei passar, o quanto esqueci

De coar, e o açúcar de nós, ainda me pergunto,

Onde estará?

Gabriel Amorim 10-04-2014