A poética beleza da traição
A conheci num baile; uma menina
Quieta e até um tantinho acanhada.
E eu, quase tão tímido quanto ela,
De Cupido levei certeira flechada.
Clichê romântico, ela era muito bela:
Típica “virgem pálida e vaporosa”.
A um anjo celeste eu a compararia,
Ou, para apelar, até a uma rosa…
(Talvez alguém com mais talento que eu,
Um romântico daqueles – à moda antiga –,
Gostasse de seu perfil e lhe dedicasse
Alguma melosa e monótona cantiga…
…Mas deixo isso com eles.) A mão lhe pedi:
Ela ma cedeu, e dançamos noite afora.
Senti-me bailando nos Céus com uma fada
Até que foi chegado o tempo de ir embora.
Prometi encontrar-me com ela de novo,
Para consumarmos a nossa união.
Fiz-lhe uns versinhos – admito – um tanto insossos,
E trazia um buquê de flores na mão.
(E quem me visse saltitando pela rua
Podia fazer a comparação já cambeta
Do fidelíssimo e amoroso Romeu
Indo ver, apressado, sua Julieta…)
E num vestido um tantinho apertado,
Eis que, acolá, vejo minha fada bela,
Usando batom e esmalte escarlate:
Um suspiro de amores dei por ela…
Mas percebi que meu “anjinho casto e puro”,
“Ideal por quem meu peito tanto bate”,
Beijava outro homem no meio da rua…
Não era nada mais que uma biscate!